Parecer pela perda
do mandato agora será submetido ao plenário da Câmara em votação aberta; Cunha
ainda tenta manobra para se salvar na Comissão de Constituição e Justiça
Por: Marcela Mattos, de
Brasília
O
presidente afastado da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) -
04/05/2016(Pedro Ladeira/Folhapress)
Depois de 225 dias, finalmente, o Conselho de Ética da Câmara dos
Deputados conseguiu votar o mais longo processo de cassação de mandato da
história. Por 11 votos a 9, o colegiado recomendou a perda do mandato do
presidente afastado da Casa Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Agora, o caso segue para o
aval do Plenário, em votação aberta, com uma escala anterior na Comissão de
Constituição e Justiça (CCJ), a quem cabe deliberar sobre os aspectos
processuais no Legislativo - e não sobre o mérito da acusação.
O parecer, assinado por Marcos Rogério (DEM-RO), concluiu que Cunha
quebrou o decoro parlamentar ao mentir sobre a manutenção de contas bancárias
não declaradas no exterior durante um depoimento à antiga CPI da Petrobras. O
relator também incluiu no texto provas coletadas pela força-tarefa da Operação
Lava Jato. Cunha é réu na Justiça por suspeitas de lavagem de dinheiro desviado
dos cofres da Petrobras para benefício próprio.
"O caminho do dinheiro é revelador, mostra quem é o dono, quem tem
as senhas, quem movimenta a conta, a quem o banco deve mandar correspondências
e a quem deve prestar contas. Não é adequado premiar a esperteza em detrimento
da verdade", disse o relator. "O deputado mentiu para criar um
contexto político desfavorável à Operação Lava Jato e para atacar a
Procuradoria-Geral da República. Utilizou a CPI da Petrobras como um palco para
barrar as investigações, mentiu e omitiu informações."
A defesa de Cunha repisou o argumento de que ele não é titular de contas
bancárias, mas possui os chamados trustes - instituto jurídico no qual alguém
transfere o controle de bens a um terceiro. "Por que o parecer do relator
tem 90 páginas? Porque não tem uma linha, uma prova. Cadê o número da conta
corrente em nome do meu cliente?", disse o advogado Marcelo Nobre,
enquanto exibia as quatro letras - cadê? - rabiscadas num pedaço de papel.
"O relator insiste que cachorro é cavalo", emendou.
Aliados de Cunha afirmam que ele ainda detém cartas na manga, entre elas
recursos que lotam a Comissão de Constituição e Justiça que podem anular todo o
processo do conselho, levando a tramitação da representação à estaca zero.
Também aguarda deliberação da CCJ parecer elaborado pelo aliado de Cunha que
traz a possibilidade de que a decisão do conselho seja revertida em plenário.
Tia Eron - O ponto alto da votação foi a
fala da de Tia Eron (PRB), a desconhecida deputada baiana que roubou os
holofotes há uma semana por ser apontada como decisiva para selar o resultado.
Tia Eron, sim, elevou o tom. Pediu a palavra para dizer que não votaria sob as
ordens de seu partido e atacou quem reclamou do seu sumiço na semana passada.
"Não mandam nessa nega aqui! Nenhum dos senhores manda", disse, com
dedo em riste e semblante fechado. Mais tarde, votou pela cassação.
Com o voto dela declarado, não foi necessário o tiro de desempate do
presidente do Conselho, José Carlos Araújo (PR-BA), a quem já se sabia que
deliberaria pela cassação.
A exemplo das sessões anteriores, a gritaria entre os escudeiros de
Cunha e seus críticos atingiu altos decibéis e degenerou em baixaria. Wladimir
Costa (PMDB-PA) provocou alvoroço ao afirmar que num grupo de "1 milhão de
petistas, 999.999 são bandidos, ladrões e batedores de carteira". Petistas
reagiram com gritos de "ladrão de rádios" dirigidos ao peemedebista,
que é radialista. Em seguida, Costa deixou claro que as sessões do colegiado
muitas vezes mais parecem um picadeiro: fiel aliado de Cunha, depois ouvir o
voto de Tia Eron, ele anunciou que votaria inexplicavelmente a favor da
cassação do amigo que defendera há instantes. Àquela altura, o jogo já estava
jogado.
Acusações - Nesta terça, o Banco Central
decidiu cobrar uma multa de 1,13 milhão de reais do peemedebista e sua mulher,
a ex-jornalista Cláudia Cruz, por manter recursos não declarados no exterior.
Ontem, a Procuradoria-Geral da República apresentou uma ação civil na qual
cobra que Eduardo Cunha devolva cerca de 20 milhões de reais e tenha os
direitos políticos suspensos por dez anos.
A Operação Lava Jato investiga as contas secretas, suspeitas de servirem
como um dos caminhos para mascarar o recebimento de propina no petrolão. O
presidente da Câmara rechaça as acusações e afirma ser apenas beneficiário de
um truste sobre o qual não tem o poder de realizar movimentações financeiras.
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